segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Esperando o Trem - "Causo" Ferroviário

*Do Vida Sobre Trilhos

Bons dias senhores Usuários!

Segue agora um causo publicado na Revista Ferrovia. Uma história contando um pouco sobre os trens de longa distância operados pela Ferrovia Paulista Sociedade Anônima - a FEPASA. Leiam:

Neste sábado, decidi fazer um programa diferente e com Walda, minha fiel companheira, fomos fazer uma viagem de trem. Dirigimo-nos à estação Fernando Prestes da antiga e gloriosa Estrada de Ferro Sorocabana e lá pegamos o "trem de longo percurso" da Fepasa que sai de São Paulo e vai até Assis.
No percurso, o trem pára em São Roque, Sorocaba, Botucatu, Ipaçu, Cerquilho e outras cidades até chegar em Assis. A viagem é uma legítima incursão na "máquina do tempo". Nada parece ter mudado em relação às viagens que eu fazia há trinta anos atrás. O mesmo tipo de vagão, o mesmo tipo de uniforme dos empregados...
Até a conversa dos ferroviários parece ser a mesma.
Bastou eu perguntar o tempo total do percurso do trem de São Paulo até Assis que o chefe do trem respondeu-me resignadamente:
- O tempo total deveria ser de doze horas, mas, em geral leva mais de quatorze horas. É sempre assim: tem dia que leva treze horas e tem dias que leva quatorze horas. Quase nunca o trem consegue cumprir só as doze horas previstas.
Ao ouvir essa lamúria, essa constatação tática, aceita pelo ferroviário como se fosse desígnios dos deuses, tive uma ideia que me pareceu brilhante, quase que genial. Na hora, já prôpus ao chefe do trem:
- E se a Fepasa dissesse que o percurso leva quatorze horas? Na esporádica vez que o trem conseguisse fazer a viagem em doze horas, isso seria considerado um feito, uma glória, um sinal de melhoria dos serviços.
O velho ferroviário começou a pensar e eu olhava.
O homem após cerca de trinta segundos de reflexão, deu seu parecer sobre minha ideia genial. Seria ela mesmo genial? Então:
- Não dá, não funciona, não daria certo. Mas eu não sei explicar o porquê, faltam-me palavras, mas, eu sinto que a ideia não funcionaria...
Tentei dialogar, mostrei as vantagens, políticas de se voltar a ter um trem que, graças a um expediente é claro, poderia cumprir o seu horário. Nada feito. O chefe do trem só dizia que a ideia não podia funcionar. Atribuí a oposição do ferroviário a um despreparo dele as inovações tecnológicas.
E o leitor, o que acha?
Não seria uma tentativa de melhorar a imagem da ferrovia anunciar que a viagem levaria quatorze horas como ela em geral leva e às vezes que conseguir fazer a viagem em doze horas e celebrar o acontecimento...
Haveria algum impedimento mágico? Matemático, lógico à minha ideia? É o que veremos a seguir:
Resolução
Realmente é impossível, é burrice alterar o horário previsto do trem para quatorze horas.Como o trem tem que cumprir horário em cada estação intermediária, as folgas seriam consumidas estação por estação.Assim, na primeira estação que é São Roque, se o trem fizesse o percurso sem usar a folga, ele não poderia sair da estação com essa folga, pois teria que esperar por um possível último passageiro que chegasse no último minuto e assim, um trem que geralmente leva quatorze horas e às vezes, poucas vezes, leva doze horas, se adotasse o meu plano genial obrigatoriamente sempre levaria quatorze horas ou mais...
Matematicamente certo estava o chefe do trem e eu matematicamente errado.


*"Causo" publicado na Revista Ferrovia Nº141 - Mar/Abr-1992

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