quinta-feira, 9 de junho de 2011

Bastidores de uma greve por respeito


Além do aumento, ferroviários da CPTM demonstram indignação com outros setores considerados deficientes, segundo funcionários. Greve parou parcialmente quatro linhas por 48 horas e todo o sistema por 24 e foi a primeira e maior da malha paulista

*Do Vida Sobre Trilhos

Bons dias Senhores Usuários!

Proposta inicial ironizada por funcionários - 31/05/2011
Cinco por cento. Esse é o percentual de reajuste que os funcionários dos quatro sindicatos - Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias de São Paulo - STEFSP, Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias da Zona Sorocabana - STEFZS e Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo e o Sindicato dos Trabalhadores da Zona Central do Brasil - Sindcentral - reivindicam desde o ano de 2007 e não tem sido atendidos desde então. No ano de 2009, houve ameaça de greve, da qual não prosseguiu. Em 2010, o mesmo, com um porém: houve um aumento obtido por meio de conciliação no Tribunal Regional do Trabalho: 0,88% em vista dos 5% reinvidicados.
Esse ano foi diferente.
No ano passado, segundo os membros da Sindcentral, havia pouca união sindical para que mobilizasse os ferroviários dos pares de linhas a quais cada sindicato mobiliza - STEFSP (linhas  7 - Rubi e 10 - Turquesa), STEFZS (8 - Diamante e 9 - Esmeralda) e Sindcentral (11 - Coral e 12 - Safira), além dos engenheiros - e, esse ano, por um acaso, os Metrô também reivindicava seu aumento, já que também havia mudado a época de seu dissídio para não gerar confusões eleitoreiras como as do ano passado.
Família Ferroviária - Faixa da campanha salarial da
Sindcentral
Com essa união metroferroviária, o transporte sobre trilhos pararia por completo se as companhias de trens e a do metropolitano não se movimentassem em busca de solução para que um caos já imaginado em diversos tweets do Metrô (já que a CPTM NUNCA acreditou na hipótese de uma parada) avisar sobre o Plano de Apoio à Empresas em Situação de Emergência, a operação Paese. A CPTM foi crer na possibilidade da greve ocorrer de fato quando a assembléia foi iniciada às 19h, nas sedes dos sindicatos e, no caso da Sindcentral, em frente a estação Brás.
Para um público de pouco mais de 150 pessoas participando ativamente da assembléia e funcionários em operação, os sindicalistas apresentaram a proposta feita pela companhia e decretaram a greve. O vice-presidente do Sindicato afirmou veemente que o Tribunal que realizou a conciliação entre sindicato e companhia poderia não seria justo e não estava à favor das condições do funcionário da companhia, segundo ele, este mesmo tribunal fez os ferroviários "engolir" o aumento de 0,88%, mas, desta vez, foi diferente:
"O tribunal, aquele tribunal que na sexta-feira, os companheiros que estavam aqui presentes, que vieram nos ajudar na panfletagem, viu que nós denunciamos 'não vamos esperar nada de bom do tribunal pois esse foi o tribunal que empurrou goela abaixo o 0,88%', vocês lembram muito bem. Esse mesmo tribunal ontem falou pra CPTM: '2,75% é pouco. Vou dar uma lição de casa pra CPTM e pros ferroviários: vão embora agora e a CPTM volte com uma proposta melhor e apresente-a' ou nós vamos parar amanhã. A CPTM se defendeu com o seguinte argumento: 'estamos dando o reajuste de 2,75%, um por cento a mais que eles tem de direito por força de acordo coletivo que foi assinado com os três sindicatos (Sorocabana, Trabalhadores em Empresas Feroviárias de SP e Engenheiros) . Naquele momento, eu pedi a palavra pra presidente do tribunal e falei que, o ferroviários da zona leste não tinham aceito aquele acordo dos 0,88% e não aceitariam uma nova imposição do tribunal. O tribunal disse a CPTM para ir embora, fazer a 'lição de casa' e amanhã retornem às 12h15 com uma nova proposta da CPTM, com um novo processo de negociações para nós."
Durante a assembléia, os diretores apresentaram um novo tratado com 65 cláusulas sociais foi assinado, porém, só ficou emperrado no que se refere aos reajustes de salários, benefícios e o dissídio. Palavras de ordem, gritos constantes quando se referem as propostas da CPTM como "vergonha" eram proferidas a toda hora.
A tensão era vista a cada momento durante cada ligação recebida pelo diretores dos sindicatos.
Adesão dos funcionários a greve - 31/05/2011
As assembléias aconteciam ao mesmo tempo, na Sorocabana, Ferroviários de São Paulo, Engenheiros e Metroviários. Todos estavam se sentindo fortes, unidos para um movimento que  somente fora relatado por um ferroviário aposentado, presente na assembléia da Central e que discursou aos presentes. Martinelli, 86 anos, viveu uma agitação sindical difícil: Era Vargas e Ditadura Militar de 1964. Como ferroviário, contou que unia em sindicatos (portuários, aeronautas e ferroviários), quando um tinha problemas com seus patrões e/ou sindicatos patronais e mobilizava uma parada em prol de um sindicato de classe. Quando se tratava de ferrovia, Martinelli tem histórias de se parar ferrovias BRASIL AFORA (ou seja, o que houve nessa greve foi único para esse modelo estatal, mas, não novo). Não duvidem que, pela idade de Martinelli, as grandes greves ferroviárias da RFFSA ele esteja envolvido.
Durante todo o tempo, enquanto as definições ainda não saiam, a CPTM não divulgava nenhuma tentativa via redes sociais e site oficial sobre possibilidade da greve, o Metrô dava sua última cartada num sindicato já decidido a parar as operações no dia primeiro de junho: um fax chegou aumentando a proposta anterior (6,39% mais aumento real de 1,3%) para 8% de reajuste salarial, também ao vale-refeição (VR), vale-alimentação de R$ 150, licença maternidade de 6 meses e avanços nas questões internas da companhia na relação empresa-funcionário.
Durante a assembléia do dia 31, dois terços dos funcionários, mesmo com um dos representantes da Sindcentral presentes e apoiando a parada, ficaram em dúvida e marcaram uma nova assembléia, para o dia 2/6. As linhas 8, 9, 11 e 12 passaram o dia 1º em operação parcial. Durante o dia 1º de junho, houve outra assembléia, onde a CPTM novamente não fez uma proposta satisfatória e a greve, agora prosseguiu até o dia 2 quando em nova assembléia, a CPTM fez nova proposta - 4,3%, 1,5% de aumento real e R$19,30 no vale refeição -, fazendo os ferroviários repensarem recuarem.
Mas a greve ainda não havia acabado e a proposta aceita. Após prejudicar 2,4mi de usuários diários do sistema paulista da região metropolitana e interior (Jundiaí e região servida pela linha 7 - Rubi), em questão de horas, as linhas 7 e 10 estavam de volta a circulação. Demais, iniciaram a operação normal às 4h do dia 3 e já às 0h, os cargueiros circulavam normalmente.


O que ninguém fala da greve e o que os funcionários não expõem


Não é fácil e pode parecer comum para muitos justificar somente a greve por salários. Poucos dizem que esta foi só e tão somente por melhores condições de trabalho, o que chega a ser o caso da ameaça do Metrô e a greve da CPTM, mas, no caso da CPTM, é um pedido, uma correção salarial que não era efetuada desde 2007. Se realmente os funcionários fossem cobrar o equivalente ao período, some aos 5% reivindicados mais 8,26% que são as perdas durante os últimos quatro anos.
O que muito se falou direto dos funcionários foram de falhas, desde operacionais, manutenção, planejamento e material rodante. Por que os próprios funcionários apontariam, talvez até mesmo, erros que possam ter seu dedo de culpa? Busca de solução.
Durante discurso, um funcionário disse o seguinte:
"Eles pagam um preço absurdo num curso pra quê? Pra você ser co-responsável em caso de sofrer um acidente e "tirar o deles da reta", no português claro. Vi um maquinista reclamando que estava segurando o trem lá porque o homem-morto não funciona. A CPTM mostra uns trens bonitos, uma cara bonita, mas por dentro uma carcaça. O trem é bonito, mas, o trilho parte ali... Entre Itaquera e Guaianazes, todo mundo sabe, ali é uma gambiarra, era pra ser Metrô, ele tava voltando pra  Arthur Alvim pra transpor para outra linha e já vi usuário descendo do trem pra "pegar" o maquinista!"
A citação é parte do discurso de um funcionário de uma subestação, que afirmou também não só ele como outros funcionários terem problemas com treinamentos e equipamentos indevidos e/ou fora das normas técnicas. Conforme a citação, o trem que cita é o da último adquirido pela companhia e que circula por quase todas as linhas da CPTM. Não só esse funcionário que nem é da operação dos trens, mas, os próprios maquinistas hoje evitam estar em linhas em que o CAF Série 7000 esteja na escala (o que atualmente é quase impossível, salvas exceções).
O desconforto com o dispositivo de segurança chamado homem-morto, dispositivo esse vital para a segurança da viagem, já que ele é quem verifica se o maquinista está presente e com condições de saúde adequadas para prosseguir viagem, diferente de outros trens que tem acionadores nas mãos e nos pés, mas, no caso de estar nos pés, próximo ao painel, ele fica fora da região do painel de comando. Além de ficar longe do alcance, o dispositivo deve ser verificado, em média, a cada um minuto pelo maquinista e muitas vezes, falha, o que acaba por gerar freadas bruscas, pois aciona o freio de emergência.
Na operação, uma reclamação feita por funcionários é o "saber desnecessário": no sistema de estações, funcionários sabem e devem saber, por exemplo, o que devem fazer caso haja um vazamento de combustível fóssil numa refinaria localizada às margens da linha 10, próximo a estação São Caetano do Sul. Detalhe: o funcionário presta serviços na linha 12 - Safira, que serve os municípios de Poá, Itaquaquecetuba e São Paulo. E julgam que o necessário, por exemplo, não dispõe e/ou não podem divulgar, como as informações da situação das linhas e intervalos. No quesito manutenção e planejamento, não fica atrás.
Hoje a CPTM se prepara para ter, antes da gestão José Serra, quase o dobro da frota que encontrou ao assumir o estado em 2006. Somados aos discutíveis série 2000 fase II ou 2070, somam-se 105 novos trens e quase toda frota renovada. Mas, inserir uma frota inteira como essa, prevê ou, ao menos deve prever, obras e um bom planejamento para renovação e construção de subestação de energia. Mas, quando os funcionários citam que, as subestações que são renovadas, citam com desgosto: mal renovadas, já ultrapassadas.
E por quê?
Burocracia e o planejamento futuro não pensou em demanda futura. Logo, em breve, mesmo que os novos trens não sejam potenciais "beberrões", as subestações não estarão prontas para a maior facilidade do sistema de tração: produção e transmissão de energia via rede aérea. Hoje, os trens desperdiçam essa energia "queimando-a" por efeito joule (calor).
A manutenção nos trens também fica a desejar. Trens hoje estão sendo sucateados após parceria público-privada (PPP), onde a CAF deveria ficar responsável pela manutenção dos trens enquanto não puder fornecer os 36 novos trens para a linha 8. Resultado: hoje a CPTM tira trens de linhas que não parecem fazer falta (como 7 e 9) para cobrir a falta dos trens sucateados pelos profissionais inaptos à manutenção da frota, segundo fontes da própria empresa e discussões em fóruns voltados à companhia.


Os resultados da greve


Os sindicatos sempre atuaram nas reivindicações aos seus em separados. Seguia assim desde tempos da Rede Ferroviária Federal S.A., Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) e durante a vigência da CPTM também. Várias vezes, movimentos de greve eram iniciados, porém, não iam pra frente por serem isolados. Movimento esse que só aconteceu por indignação: o semblante dos funcionários presentes e até de outros que se via com o colete escrito "CHEGA!" e o adesivo da campanha salarial (foto) demonstrava que não era só um sindicato, um corpo de funcionários revoltados.
Haviam outros funcionários, os ex-Fepasa, também estavam no movimento. Fepasa essa que, na visão da grande imprensa, se ameaçasse parar, ainda recebia alguma atenção. A CBTU/ RFFSA nunca foi digna de atenção historicamente. Não se sabe quando, como ou porquê dessa desatenção, desse desligamento, mas, viu-se que naquele dia que o único repórter/jornalista presente na Sindcentral o tempo todo é este que vos fala. Durante o tempo que permaneci, uma rádio tradicional somente ligou ao sindicato atrás de informações e os diretores emitiram um boletim  oficial pela web afirmando a paralisação das atividades às 0h. Nada mais.
Reflexos da greve: No dia seguinte, ônibus da Unileste
superlotados pela absorção do público do trem; Paese
não deu conta dos usuários
O resultado às 4h da manhã, quando as estações deveriam abrir e o primeiro trem estar para chegar seria verdadeiramente impactante. A imprensa ali correu atrás, pela manhã passou a mostrar a situação e tentar apontar meios de como o usuário do trem de se livrar da greve e seguir para o trabalho. O primeiro dia, com parada parcial e supervisores de tração (supervisores diretos dos maquinistas) na operação dos trens em regime de emergência na operação e no centro de controle operacional (CCO) com auxílio de operacionais do Metrô ainda mantiveram o Expresso Leste operando com a frota do série 2000 (em torno de 12 trens) circulanto por todo o dia. A extensão até Estudantes, a linha Safira, atividades na subestação de Calmon Viana, Manoel Feio, Engenheiro Goulart, Estudantes, Guaianazes e no lavador de Jundiapeba pararam por completo, além das oficinas Engenheiro São Paulo e Roosevelt.
Já no segundo dia de greve, além de parar toda a operação, uma denúncia foi feita pelo sindicato da Sorocabana: uma determinação do Tribunal Regional do Trabalho mandava que os funcionários operassem 90% da frota no horário de pico e 70% no vale, porém, foram impedidos de abrir as estações por determinação da CPTM. Com isso, a greve seguiu, até a hora em que a assembléia ocorreu e encerrou a parada, porém a greve continua.
Nessa sexta-feira [10], a Sindcentral fará nova assembléia e outros sindicatos decidirão rumos até dia 12/06. Mas, uma das coisas mais importantes talvez os sindicatos não tenham percebido, mas essa greve demonstrou para quem gere a CPTM que, desde que gerir uma companhia focada no respeito ao usuário também é respeitar quem a faz. Não só dando trabalho, mas, dando remuneração, respeito, condições e também palavra. Ouvir o usuário é muito importante, chega às vezes ser mais importante do que ouvir um "ferroviário viciado", mas, também é importante respeitar o profissional da ferrovia. E isso fará daqui pra frente até mesmo que as concessionárias de transporte de cargas que, desde 1998 atuam na malha paulista e seus funcionários não são tem uma grande sindicalização ou dão importância aos sindicatos, terão novos olhos a essa entidade de classe que ganhou respeito em 18 ferrovias regionais.
Não se assustem se em breve ferroviários de logísticas se unirem em prol de melhorias em sua categoria.


Tenham uma boa semana!


*Colaborou Denis Castro

3 comentários:

Sindicato Central do Brasil - CPTM disse...

OBRIGADO PELAS SABIAS PALAVRAS DE ALGUEM QUE PRESENCIOU E REGISTROU ESSE EVENTO.
MARCIO MACHADO DA SILVA.
DIRETOR DO SINDICATO DOS FERROVIARIOS DA ZONA CENTRAL DO BRASIL.ZL

Meu Nome e Ninguem disse...

As mazelas da linha 10 também são denunciadas em um Blog. "chupetrem.blogspot", confira.

Srta. Tico-Tico disse...

Querido INOMINADO, as mazelas das Líbias, 8, 9 e 10.

Regozija-me ver que existe um envolvimento crescente pelo Ferradoário em questões que são do interesse geral, e sinto que os Blogs caminham com passos diferentes, mas no mesmo sentido e direção.

Parabéns, o post ficou excelente!

Sem esquecer, é claro, TICO-TICO, NO FUBÁ DELES, PRA NÓS É REFRESCO!

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